segunda-feira, 15 de abril de 2013

Reinheitsgebot, a ovelha negra da cerveja?


No dia 23 de abril de 1516, o Duque da Baviera Wilhelm IV, decretava a lei mais importante da história da cerveja, a Reinheitsgebot (Lei de Pureza da Baviera). Depois de quase 500 anos protegendo a cerveja alemã e principalmente o consumidor, ela caiu em desuso e virou moda critica-la. Mas a Lei de Pureza é realmente tão ruim para a cerveja alemã como alguns dizem? Ela engessa o cervejeiro? É um atraso? Conservadora?
Vale recapitular que antes de 1516, já havia em varias cidades na Baviera, o uso de algumas leis que regulamentavam a produção ou os ingredientes na cerveja, o que o Duque fez, foi apenas criar uma lei pra toda a Baviera, onde os principais objetivos eram: proteger a cerveja de adulterações que fizessem mal a população, padronizar um piso de qualidade à cerveja e maior facilidade no controle dos impostos que eram também calculados sobre as matérias-primas.
Lembrando que, a então potência cervejeira do séc. XVIII, a Inglaterra, sofreu e muito com adulterações de cervejas, principalmente o estilo Porter, com substâncias alucinógenas e tóxicas, fazendo com que este estilo sumisse do país e voltasse só recentemente com as microcervejarias.

Ao longo dos séculos a lei se adaptou aos avanços da tecnologia, incluiu o fermento como ingrediente, somando-se a água, malte e lúpulo, caiu alguns pontos, como restrições em épocas do ano, ela foi englobada na legislação alemã de alimentos e algumas lendas, como utilização de madeira pra maturação e dry-hop, é tudo permitido. Talvez seja a lei que mais se adaptou a humanidade.
Podemos fazer algumas especulações, será que a lei protegeu as cervejas alemã das adulterações nas cervejas, que ocorriam na Inglaterra? Será que por ser mais difícil fazer cerveja de acordo com a Lei de Pureza os alemães foram forçados a estudar mais as técnicas, daí hoje possuem as 3 melhores universidades de mestres cervejeiros do mundo? Nunca saberemos responder isso...

Até a década de 80, a Lei de Pureza era uma segurança para o consumidor, ele sabia exatamente o que tinha dentro do copo, muitas vezes era erradamente ligada a qualidade. Depois do ressurgimento das microcervejarias algumas técnicas e ingredientes que estavam esquecidos no passado voltaram a tona, principalmente nos Estados Unidos e Bélgica, virando moda e espalhando-se entre as microcervejarias e de forma positiva, contribuindo com a diversidade cervejeira. Já é cada vez mais frequente encontrar pequenas cervejarias na Alemanha fazendo cervejas com dry-hop, maturando em madeiras e até alguns estilos usando frutas ou especiarias, mais uma prova da adaptação do cervejeiro alemão, uma adaptação lenta, com cuidado, mas ocorrendo.
Muitos dos meus amigos donos de cervejarias na Baviera me questionam o que eu acho da Lei de Pureza, minha resposta é: A Alemanha deve manter esta tradição, nenhum outro país no mundo tem a cerveja tão inserida no cotidiano e na cultura local, nós não temos tradição para seguir, por isso, podemos arriscar, eles têm. Além disso, nenhum outro país tem tantos estilos de cerveja como a Alemanha. O que deve mudar é a mente dos cervejeiros e não a lei, o consumidor cansou de beber cerveja com o mesmo gosto, não necessita-se produzir 50 helles de 50 marcas diferentes e todas com a mesma cor, aroma e sabor, infelizmente esta ainda é a regra na Baviera e no mundo cervejeiro, copiar o que esta dando certo.
Ao julgar as finais das categorias Imperial IPA e Ambar Weizen no European Beer Star 2012, pude avaliar as 12 melhores cervejas dos estilos no mundo, todas com o mesmo perfil de aroma e sabor, ou seja, 12 weizen e 12 Imperial IPA muito próximas, dentro de cada estilo, isto é, independente da origem do estilo, é o cervejeiro que deve pensar em trazer inovação, novidade e não copiar o mesmo.
Portanto, viva as cervejas boas, que trazem personalidade, sejam elas de acordo com a Lei de Pureza ou não e como diz a música: "A vida vem em ondas, como um mar, num indo e vindo infinito."